quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

O Mundo sem Mentiras ( Série).


Como seria o mundo, se todos dissessem apenas a verdade?
Inspirado levemente em “O Primeiro Mentiroso”, filme que assisti há alguns anos, resolvi escrever esta série, na qual exponho como imagino algumas situações caso ninguém soubesse mentir.
Nesta primeira parte veremos quatro marcas famosas de bebidas e alimentos anunciando seus produtos com toda a sinceridade que o consumidor merece. Infelizmente, isso nunca acontecerá no mundo real.

Parte 1: Propagandas de algumas marcas famosas num mundo sem mentiras.
DANONINHO
Slogan:  DANONINHO NÃO VALE POR UM BIFINHO NEM POR QUALQUER OUTRO ALIMENTO.
Se você quer prejudicar a saúde de seus filhos, compre Danoninho para eles. Danoninho, assim como qualquer outro petit suisse, é prejudicial à saúde. Em cada potinho a criança ingere 32 % do limite máximo diário de açúcar que ela necessita. Além disso, Danoninho também é um inibidor da absorção do ferro, o que pode causar anemia ferropriva. Compre Danoninho, se você não se importa com a saúde de seus filhos.
COCA COLA
Slogan: SINTA O SABOR, SE VOCÊ TIVER CONDIÇÕES DE PAGAR UM BOM PLANO DE SAÚDE.
Adquira lesões nos ossos, elimine o esmalte de seus dentes, prejudique seu desenvolvimento cerebral abrindo a infelicidade e bebendo seu destruidor líquido. Coca Cola também causa diabetes, inflamação no estômago e hipertensão arterial. Coca Cola é isso aí e muitas outras doenças.
QUALY
Slogan: A QUALIDADE DE VIDA TERMINA COM QUALY.
Qualy e todas as demais margarinas fazem tanto mal quanto o cigarro. Causa disfunções imunológicas; danos no fígado, no pulmão e até mesmo em órgãos reprodutivos.  A Qualy também pode causar câncer e prejudicar a capacidade de raciocínio. Se você quiser ser burro, broxa e morrer de câncer, tudo isso sem fumar, compre Qualy.
SKOL
Slogan: SKOL, A CERVEJA QUE DESCE FORÇADA.
O abuso do álcool aumenta a mortalidade por causar doenças no fígado, câncer e doenças cardiovasculares. Porém, a Skol é diferente, pois além de provocar esses males a sua saúde, ela também trava na garganta e quem a bebe corre o risco de cuspir a bebida em qualquer pessoa que estiver próxima.


Marcelo Maia
Licenciado em Filosofia pelo CEUCLAR.

segunda-feira, 8 de julho de 2019

Antigamente Tudo Era Bom ( Parte I)

Antigamente tudo era bom, o mundo era um verdadeiro Paraíso Celeste com muita alegria, paz e harmonia entre os seres racionais e irracionais, animados e inanimados. Você que tem dez anos ou menos certamente não se lembrará dessa época, pois só a conhece através das palavras de pessoas que tem mais de 15 anos. Os que têm entre 11 e 14, apesar de terem vivido naquela época maravilhosa, não se lembram dela, pois eram muito novos.
Naquele período, que se estende desde a origem da humanidade até dez anos atrás, não havia violência; todos amavam o próximo  e ninguém era inimigo de ninguém. Não havia ladrões; portas e janelas de todas as casas ficavam abertas e só existiam e eram fechadas para nos proteger do frio e da chuva. Ninguém cobiçava ou invejava os bens dos outros a ponto de querer roubá-los. Afinal, não havia necessidade de querer o que não tinha, pois todos tinham tudo o que queria, pois ganhavam muito bem. Ah, que tempo bom!
Não havia ódio entre as pessoas, o que significa que não havia assassinatos e, nem mesmo, agressões físicas. Na verdade, não havia crimes de espécie alguma.  Os policiais daquele tempo existiam apenas para ajudar as pessoas, levando suas pesadas compras (afinal, todo mundo tinha muito dinheiro para comprar o que quisessem) para suas casas. Esses grandes amigos, funcionários públicos de um estado justo e sem desigualdade, também iam atrás de animais que se perdiam de seus donos, ajudavam velhinhos e cegos a atravessarem as ruas, contavam piadas através de um megafone para alegrar a sociedade, enfim, eles não existiam para combater a violência, já que isso não existia. 
 Você, que é jovem atualmente, vive numa época em que delegacias e presídios servem para abrigar criminosos, mas na época em que eu e todos os meus antepassados éramos jovens, as delegacias e presídios eram lugares, onde delegados, detetives, agentes penitenciários e escrivães se reuniam, bebendo suco natural, e se encontravam com policiais militares (soldados, cabos, sargentos, tenentes e demais patentes da polícia fardada) que iam todas as noites às delegacias e presídios para entregar relatórios sobre os auxílios prestados à população e quais piadas foram contadas durante o dia para um povo, já alegre por natureza. 
O nome presídio, naquela época paradisíaca, não tinha nada a ver com “preso” ou “prisão”, mas se originava de “prezado”, pois naquele local estavam os prezados amigos do povo.  Porém, vamos deixar a semântica daquela época para outra ocasião, pois temos assuntos muito mais relevantes para serem tratados neste texto como, por exemplo, a saúde naquela época.
Como não existiam bebidas alcoólicas, nem cigarros nem qualquer outra droga para preencher o vazio existencial (que não existia, pois a vida era plena), a maioria da população morria de causas naturais aos 150 anos, respirando um ar puro e alimentando-se saudavelmente.  Os hospitais só existiam para atender idosos acima de 120 anos e mulheres grávidas. Também não havia mortalidade infantil, já que toda mãe era saudável e só fazia sexo após o casamento com um homem saudável, também virgem até a noite de núpcias.
As crianças, que nasciam saudáveis e felizes, a partir dos três anos de idade brincavam nas ruas até tarde da noite, pois não existiam pedófilos, sequestradores,  nem tiroteios nas ruas. Por falar em tiroteios, as armas só existiam para lançar balas doces e saborosas para as crianças que ficavam nas ruas até duas horas da madrugada e acordavam às seis da manhã, animadíssimas, para irem para a escola, lugar onde havia muito amor e respeito  pelos professores .
Como haviam muitas maravilhas naquela época, resolvi dividir o texto em partes( ainda não sei quantas) e postá-las semanalmente. Nas próximas partes desta série sobre o maravilhoso passado, além de outros assuntos, vamos falar sobre a arte daquela época e como o mal surgiu e se desenvolveu há dez anos.

Marcelo Maia
Licenciado em Filosofia pelo CEUCLAR BH

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Apaixonado ou Escravo do Ideal?





Na juventude, o filósofo francês René Descartes (1596 – 1650), apaixonou-se por uma garota estrábica e, a partir dessa paixão, o pai da filosofia moderna criou a mulher de seu sonho e durante muito tempo não se interessou por qualquer mulher que não fosse vesga. Essa obsessão permaneceu com o filósofo, até ele concluir que seu gosto romântico nada mais era que uma criação de sua mente e que para vencê-lo seria necessário usar seu raciocínio lógico e seu livre arbítrio contra si mesmo.
Assim como Descartes, muitas pessoas têm esperado o homem ou a mulher ideal, na maioria das vezes, criado pela mente na puberdade, período em que o corpo se transforma originando desejos sexuais e a mente indica que necessitamos do outro―física e/ou mentalmente― para satisfazermos esses desejos. Porém, diferente dos outros animais, os seres humanos desenvolveram um sentimento, além da simples satisfação sexual, que chamamos de atração física, paixão, romance ou amor.
Com o corpo preparado para receber outro corpo e uma mente diferenciada da dos animais, o adolescente se apaixona pela primeira vez. Essa entrada do homem e da mulher no mundo romântico acontece na maioria das vezes através da admiração pelo físico e/ou pelo caráter de alguém próximo como um vizinho, amigo ou até mesmo um parente. Porém, a primeira paixão pode, também, ser alguém além do alcance do apaixonado como uma celebridade real ou um personagem fictício. E é exatamente esse primeiro ser amado que vai formar na mente do amante, a imagem de seu parceiro romântico perfeito.
Porém, o romance com a primeira pessoa amada nem sempre é concretizado ou, quando é, não permanece durante a vida inteira. Sendo assim, o amante rejeitado sai em busca de alguém que tenha as mesmas características daquela imagem fixa em sua mente. A imagem que convence que apenas alguém como ela possa lhe trazer a felicidade espiritual e a satisfação de seus desejos físicos e sexuais.
Na esperança de encontrarmos a pessoa ideal para se amar, passamos a  descartar da nossa vida romântica, pessoas maravilhosas e incríveis com quem poderíamos viver um grande amor real. No entanto, nenhuma delas possui as características do parceiro ideal, pintado em um quadro, cujas cópias estão pregadas em todas as paredes de nossa mente.
 Nem sempre a pintura do parceiro ideal é um corpo completo. Em alguns casos, no quadro criado pela mente romântica da adolescência, há apenas um par de olhos de uma determinada cor, um conjunto de músculos bem definidos ou seios rígidos e volumosos, entre outras características físicas. 
Há também, em número bem menor, aqueles, para os quais as qualidades do amado perfeito não está matéria, e sim no intelecto, na alma. Não há vantagem alguma nisso; os amantes do espírito tornam-se tão cegos e solitários quanto os materialistas. 
Ambos são escravos de uma ilusão e estão sempre reclamando, dizendo que não encontram alguém para amar e fazê-las felizes. Porém, na verdade, já encontraram, mas as comparações com a imagem fixa na sua mente impedem que qualquer relacionamento ocorra ou, caso ocorra, que não seja duradouro.
Em “Blues da Piedade”, do álbum Ideologia (1988), Cazuza (1958-1990) diz que devemos pedir a Deus piedade "pra quem não sabe amar e fica esperando alguém que caiba no seu sonho”.  Nesse trecho, o compositor está se referindo claramente a pessoas como o filósofo Descartes, que se tornaram escravas do ideal e dão as costas para o real bem ali, diante delas. Sim, essas pessoas são dignas de piedade, de compaixão e precisam, assim como Descartes, usarem a inteligência para destruir essa imagem que os impede de sorrir, de abraçar, de beijar e de gozar.
Não estou dizendo que devemos nos entregar a qualquer romance por uma carência física ou para suprir a falta de alguém. De forma alguma devemos fazer tal crueldade conosco e com os outros. A minha intenção neste texto é exatamente o contrário, ou seja, alertar sobre os males do "romance ideal" que, muitas vezes, nos impede de vivermos um romance real e prazeroso, mental e fisicamente.


Até a próxima.

Marcelo Maia
Licenciado em Filosofia pelo CEUCLAR-BH.

domingo, 30 de outubro de 2016

A Voz dos Imbecis

          A internet é hoje, sem sombra de dúvida, o meio de comunicação mais popular  e o mais completo do mundo. Entre inúmeras vantagens, o acesso a essa mídia possibilita que seu usuário seja, além de público, o próprio astro do espetáculo. Todos têm a chance de  divulgar suas ideias e opiniões e mostrar seus  talentos para um público bem maior que apenas amigos e familiares Isso graças às redes sociais como o Facebook ou canais de vídeos como o YouTube .
No entanto, nem tudo são flores na internet e como disse Umberto Eco, poucos meses antes de sua morte, “as redes sociais dão o direito à palavra a uma legião de imbecis que antes eram ouvidos apenas nos bares após tomarem umas e outras, sem prejudicar a coletividade”.
Concordo com o autor de “O Nome da Rosa”, afinal  ao abrir a porta para os talentosos, a internet não a fecha, possibilitando assim a entrada dos imbecis que encontraram um meio de levarem suas idiotices para além dos ouvidos de seus amigos de copo Basta criar uma conta no Facebook, outra no Twitter e mais uma no YouTube e qualquer imbecil está pronto para jogar a merda no ventilador.
O imbecil da internet é “conhecedor” de todos os assuntos e está convicto que suas opiniões são extremamente relevantes para a sociedade, por isso se sente na obrigação de compartilhá-las. Após uma rápida pesquisa no Google, ele já se sente capaz de elogiar e descer o pau em filmes, músicas e espetáculos, muitos dos quais o imbecil não conhece mais que o título. Embora seja um excelente crítico de arte, suas grandes paixões são Teologia, Sociologia, Filosofia e, principalmente, Política.
Como não quer ser um alienado e, muito menos, ser chamado de isentão, o “incrível colunista” decide sua posição política no “cara e coroa”. Com um vasto conhecimento wikipédico , o analista político das redes sociais não analisa porra nenhuma, simplesmente defende, calorosamente, sua posição política que foi escolhida por uma moeda de cinquenta centavos.
Outra característica dos doutores das redes sociais é o amor por debates. Imbecis oponentes se encontram geralmente no You Tube, e se agridem com os palavrões da atualidade: bolivariano, bolsominion, neoateu toddynho, seguidor do deus das lacunas, esquerdopata, coxinha, massa de manobra. Sinto até saudades dos palavrões antigos. Porém, não são apenas xingamentos que há nesses debates, afinal todos esses sábios são graduados, mestrados e doutorados pela incrível Universidade Wikipédia. Sendo assim, através dos debates, os imbecis têm a oportunidade de expor seus conhecimentos sobre diversas áreas do saber, principalmente Teologia, Filosofia, Física, História e Política. O pior é que vão conquistando seguidores, que também passam a divulgar suas ideias e conhecimentos adquiridos com seus mestres. É a proliferação da desinformação e da imbecilidade.
Como os imbecis estão usando o mesmo meio de comunicação que aqueles que realmente sabem o que dizem, fica difícil discernir quem é quem sem avaliar o que está sendo dito. Então, pesquise, compare e julgue  o que lê e ouve ou corra o risco de se tornar eco da voz dos imbecis.

Até a próxima
Marcelo Maia Gomes
Licenciado em Filosofia pelo Ceuclar


segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Conhecimentos Linguísticos de um Sábio-Burro


Existe coisa pior que conversar com um burro? Pode parecer que não, mas se tem algo que me irrita mais que uma conversa com um estúpido ignorante é um diálogo com um burro que se considera sábio. O “sábio-burro” é o cara que aprende alguma coisa na internet, na televisão ou em qualquer outra mídia e fica ansioso para demonstrar seu conhecimento, afinal quer mostrar que não é tão imbecil como os outros pensam. No entanto, o sábio-burro não sabe que há hora e lugar certo para tudo, inclusive para expor o que se sabe. São tantas besteiras que saem da boca de um desses sujeitos que apenas um terço delas já seria assunto para um livro, por isso nos parágrafos seguintes apresentarei apenas alguns “conhecimentos” etimológicos do burro-sábio.
Para começar, o próprio termo que uso aqui para defini-los já é um bom motivo para um sábio-burro  querer mostrar seus “conhecimentos” linguísticos.  Para aparecer e por se achar inteligente, começa a dissertar sobre o animal quadrúpede:
“Há há há!—o sábio-burro adora rir antes de suas explicações intelectuais— o burro é um animal inteligentíssimo, pois se souber que há um perigo adiante, ele não prossegue em sua caminhada.”  É claro que até um sábio-burro sabe que a palavra “burro” é usada como um termo pejorativo  para se referir a pessoas com pouco conhecimento em uma ou mais área. Portanto, sua intenção não é instruir, e sim aproveitar a oportunidade para mostrar sua “grande sabedoria”, mas nem sequer sabe que os ignorantes como ele são chamados de burros porque empacam em uma ideia, o que os impedem de ultrapassar o nível intelectual em que se encontram.
Irritante mesmo é quando o sábio-burro decide mostrar seu conhecimento sobre a origem das palavras, mas não com a intenção de satisfazer a curiosidade de alguém, e sim porque quer refutar um argumento ou, como já foi dito anteriormente, para mostrar que é o sabedor de tudo.  Se ele fica sabendo que uma pessoa não crê em divindades, não hesita em perguntar qual a religião de tal pessoa só para ouvir a palavra “ateu” e começar com sua aula de etimologia:
“Há há há!  A palavra “ateu” vem do Grego “atheos” que significa " o que nega e abandona os deuses". Sendo assim, se você nega ou abandona um deus significa que você acredita em sua existência, pois como negaria ou abandonaria o que não existe?”
Por falar em religião, o nosso “amigo sábio” também não perde tempo quando escuta tal palavra e já vem com aquele  blá blá blá de que o termo tem origem em “religare”, que em latim quer dizer religar, reatar. Ainda no campo religioso, ele vai dizer que você não frequenta igreja, pois a igreja é a própria pessoa, afinal ela tem origem na palavra grega "ekkyesia" que significava simplesmente um ajuntamento do povo. Haja paciência!
O que esse “inteligente” ignora é que a linguagem é algo dinâmico e que com o tempo as palavras adquirem novas formas, novos significados e suas origens não anulam o que elas expressam posteriormente.

Controle-se quando estiver próximo a um desses “etimólogos” e um de seus dedos do pé bater em um móvel, porque se você gritar aquele palavrão, certamente irá ouvir que “ o que você disse é uma caixinha redonda usada para guardar rapé”.

Até a próxima.




Marcelo Maia Gomes
Licenciado em Filosofia pelo Ceuclar

sexta-feira, 21 de outubro de 2016

O Isentão



Desde criança aprendemos que nossas atitudes são boas ou são más, certas ou erradas,aquilo que temos se não é bonito, é feio; se não amo algo, significa que o odeio. Crescemos com essa ideia de que há apenas duas maneiras de se ver algo. Isso se chama “polaridade”.
Porém, há um imenso continente de opiniões entre o bem e o mal, o feio e o belo  e um largo oceano de sentimentos entre o ódio e o amor, a desgraça e a felicidade, mas muitos preferem chamar de muro àquilo que não é polo, por isso dizem que quem fica fora de um deles está em cima do muro, ou como se diz atualmente no Brasil: “ é o isentão”.
O isentão é um termo pejorativo usado para definir  alguém que não se rotula “de direita” e nem “de esquerda”.  Não apoia a corrupção do PT, mas também não é seduzido pelos discursos morais da família Bolsonaro¹. Ao mesmo tempo, o isentão tem algumas opiniões que são compatíveis com a “direita” e já outras que estão de acordo com  a “ esquerda”.  Poderíamos, então, chamá-lo de um sujeito sem personalidade própria ou de “Maria vai com as outras”?  Ao contrário, afinal ele não se sente obrigado a aceitar ou rejeitar uma opinião apenas por fidelidade a uma ideologia e isso o torna muito mais capaz de avaliar o que está sendo proposto para o país
Apesar do termo "isentão" representar o que eu disse no parágrafo anterior, os "engajados"  o usam para dizer que quem não está em nenhum dos polos é alienado e omisso aos assuntos políticos, afinal a polaridade não permite a escolha de apenas alguns bombons, mas obriga que se escolha entre levar todos da caixa ou não comer nenhum.

¹Não estou dizendo que a esquerda e a direita brasileiras têm como representantes apenas PT e Bolsonaros,respectivamente. Apenas os citei como exemplos de opiniões antagônicas.

Até a próxima.


Marcelo Maia Gomes
Licenciado em Filosofia pelo Ceuclar

domingo, 19 de abril de 2015

Máscaras Sociais

            Durante a semana, acordo às 7 da manhã e saio ás 8 para dar aulas particulares. No caminho, cumprimento minha vizinha que está varrendo a calçada de sua casa e, algumas vezes, paro para conversar um pouco com ela. Prossigo na minha caminhada, saudando algumas crianças que já estão brincando na rua. Chego à casa de meu primeiro aluno, filho de evangélicos. Saúdo-os e inicio a aula de reforço. Pergunto quais as dificuldades e na medida do possível, vou tentando solucioná-las. Por serem evangélicos, policio-me ao máximo no meu modo de agir e falar. Uma hora depois, dirijo-me à casa de outra aluna, de família católica. Na parede e na estante, quadros  e imagens de santos. Ao contrário da primeira contratante, a segunda é bem comunicativa e  até compartilhamos alguns assuntos pessoais. Ás 11,volto pra casa, ligo meu  aparelho de som e ouço as músicas que gosto, sempre cantando a minha maneira. De repente, o celular toca; ou é minha sobrinha ou é uma amiga do Rio. Para cada uma delas, tenho um tipo diferente de conversa.
Até aqui, descrevi várias fases da minha vida, ocorridas em pouco mais de cinco horas. Para cada uma dessas fases, há uma máscara diferente. No  decorrer da minha vida, já usei, uso e usarei muitas outras; caso contrário, terei que viver isolado em uma redoma.
 Já ouvi, não raras vezes, algumas pessoas dizendo que demonstram o que realmente elas  são. Eu fico me perguntando: o que é demonstrar o que realmente se é? Seria uma pessoa totalmente desnuda de máscaras sociais? E isso é possível? Talvez essa possibilidade tenha existido nos primórdios da humanidade, quando o homem, no seu estado de natureza ,seguia apenas seus instintos básicos para a sobrevivência.
                Desde que o homem saiu de seu estado natural para o estado de civilização, surgiu a necessidade de se usar máscaras. Assim como há uma roupa para cada ocasião, há também um tipo de personalidade(máscara) para cada situação ,local e pessoa. Além das nossas características psicológicas e físicas já formadas pelo tempo, criamos características momentâneas para nos apresentarmos perante o  outro.  São as máscaras sociais, que vestimos para esconder o nosso natural e nos proteger do natural do outro. 
                A máscara social é uma maneira do eu refletir  para o outro o que se vê nele, causando uma familiaridade entre dois ou mais estranhos.  Um homem comum usará a máscara de  cliente de um banco para conversar com o gerente  deste banco . Fora do banco, em um bar com amigos usará outra máscara e em um consultório médico se vestirá de paciente .Da mesma forma, o gerente do banco ,o médico e os amigos boêmios usarão diversas máscaras sociais, dependendo da situação e da pessoa com quem estão relacionando
Existem diversos seres  em nós ,que vão surgindo de  acordo com as situações . Há o ser interno, escondido pela máscara social, há o ser visto pelo outro e o ser que o eu se vê no outro. Da mesma forma, o outro depende do eu para saber que tipo máscara irá usar.
 Então, nunca somos verdadeiros? Ao contrário, somos vários verdadeiros. Dizer que alguém não  tem personalidade leva em conta um conceito do senso comum e não tem nenhum fundamento científico ou filosófico.  Dizer que alguém não tem personalidade é negar as máscaras sociais  e se afirmar como alguém que anda com uma radiografia psicológica mostrando para todos o que realmente é; mas, afinal, o que realmente somos?
Se alguém me pergunta quem eu sou ,tenho várias respostas: “Sou Marcelo, filho de Fortunato e Célia, licenciado em Filosofia, poeta, blogueiro, pai do Klaus, tio da Tatá, apaixonado por Fulana, fã do Pink Floyd, cliente de um banco, freguês de um supermercado, convidado de uma festa, espectador de uma peça, etc. 
São várias respostas para uma pergunta só, várias definições para Marcelo Maia Gomes.  Entretanto, qual dessas é a minha PERSONALIDADE sem máscara? Qual dessas personalidades não foram formadas a partir do meu convívio com o outro e por estar diante de uma situação?
Não há resposta para isso, pois todas as personalidades são influenciáveis e adaptáveis ao momento; todas elas não passam de máscaras de conveniência. Mesmo, aquele que diz  expor  o que há no seu interior, depende do outro para essa exposição.
Para Sartre, o outro é o espelho para o indivíduo e a partir dessa intersubjetividade definimos nosso eu de acordo com a situação ,momento e local. O outro que está diante de mim influencia o meu eu. Se estou diante de uma pessoa religiosa ,minha consciência prevê as consequências de eu me assumir como um ateu e, da mesma maneira, o religioso se prepara interiormente para tentar me convencer da existência de Deus. Escolhemos, então, que máscaras usaremos; a do debate sobre a existência ou não de um ser supremo ou discursaremos sobre futebol. Ou seja, o eu  não se define sem o outro.
A  partir do outro, o indivíduo se torna vários eus, que muitas vezes entram em conflitos, fazendo com que nossa consciência nos acuse de hipócritas. Porém, o que é a hipocrisia, senão uma máscara social, que vestimos para  protegermos  e escondermos o nosso Eu?  Então, o que na verdade é o EU? Um ser dotado de características próprias ou um ser refletindo a imagem do outro, que por sua vez reflete a imagem do eu? Há uma existência isolada ou toda existência é dependente da outra?

O EU é a própria pessoa, a IDENTIDADE que se resguarda atrás de várias personalidades. O EU é a parte intacta do ser humano, a qual o outro só deve conhecer o mínimo possível. Tudo que o outro conhece do EU são os eus, vestidos de máscaras sociais. Eu sou o estranho para o outro e ele é o estranho para mim, por isso usamos disfarces para nos parecermos familiares um ao outro.

                                                         Abraços
                                     Marcelo Maia
Licenciado em Filosofia pelo CEUCLAR